Raphael Rabello
Raphael Rabello nasceu em Petrópolis (RJ) em 1962, sendo o caçula de nove irmãos. Dentro de uma família extremamente musical, recebe as primeiras influências do avô materno, o violonista e chorão José de Queiroz Baptista, e do irmão mais velho, Ruy Fabiano, com quem aprendeu os primeiros acordes no violão. Aos 7 anos começou a tocar intuitivamente. Foi aluno de Maria Alice Salles, professora de seus irmãos, de Jayme Florence, o Meira, e do compositor e arranjador húngaro radicado no Brasil, Ian Guest.
Numa casa frequentada por muitos músicos, ouvia dos clássicos à música regional nordestina, mas sobretudo muito choro. Aos 14 anos já formava Os Carioquinhas, seu primeiro grupo deste estilo, do qual faziam parte também sua irmã Luciana Rabello e o violonista Maurício Carrilho. Com eles estréia em disco no ano de 1977, gravando o álbum “Os Carioquinhas no Choro”, sempre impressionando a todos pela precocidade e talento.
Em 1977, atua no disco “Choros do Brasil”, de Turíbio Santos, e em 1979, participa da primeira formação do conjunto Camerata Carioca (com Celsinho Silva, Joel Nascimento, Luciana Rabello, Luiz Octavio Braga e Mauricio Carrilho), quando desenvolve uma rica convivência com o maestro Radamés Gnattali, de cuja obra violonística se tornaria um dos principais intérpretes.
Juntos, gravam o álbum “Tributo a Jacob do Bandolim” (1979) – Raphael ainda como integrante da Camerata Carioca. Nos anos seguintes, toca em “O Inverno do Meu Tempo” (1979), álbum de Elizeth Cardoso, e “Inéditos de Jacob do Bandolim” (1980), lançado pelo bandolinista Déo Rian, com o conjunto Noites Cariocas. Em 1982, em dueto com Radamés, lança “Tributo a Garoto”. Cinco anos depois, o violonista presta homenagem ao maestro e parceiro com “Rafael Rabello Interpreta Radamés Gnattali”.
Seu primeiro disco solo é de 1982, e foi intitulado “Rafael Sete Cordas”. O mesmo reúne composições de João Pernambuco, Jacob do Bandolim, Garoto, Tom Jobim, do violonista paraguaio Augustín Barrios, entre outros. O álbum também tem uma faixa de sua autoria com Paulo César Pinheiro, denominada “Sete Cordas”. Acompanhado do baixista Dininho, filho de Dino Sete Cordas, e de Chiquinho do Acordeom, lança o álbum “Rafael Rabello” em 1988.
A década de 1990 é marcada por sete discos. Em 1991, sai “Raphael Rabello & Dino Sete Cordas” e “Retratos”, também com Chiquinho do Acordeom e com a Orquestra de Cordas Brasileiras. No ano seguinte, lança “Todos os Tons” (um tributo a Tom Jobim), “Dois Irmãos”, ao lado de Paulo Moura, e “Shades of Rio”, gravado nos Estados Unidos, com Romero Lubambo. Em 1993, lança “Delicatesse”, com Déo Rian. O último álbum de Raphael em vida é “Relendo Dilermando Reis” (1994).
Em 1995, o violonista volta ao Rio para concretizar outro projeto, chamado Orgulho do Brasil, que consistia na gravação de discos de compositores brasileiros. Nesse retorno, falece precocemente aos 33 anos de idade. Depois de sua morte, são lançados “Brasil Musical – Armandinho/ Raphael Rabello” (1996), “Raphael Rabello e Armandinho em Concerto” (1997), “Mestre Capiba por Raphael Rabello e Convidados” (2002) e “Cry, My Guitar” (2005). Em 2002, a cantora Amélia Rabello, sua irmã, lança “Todas as Canções”, apenas com composições de Raphael.
Durante sua breve e intensa carreira grava 22 discos - dos quais 16 instrumentais e participa de aproximadamente 600 ábuns de diversos artistas no Brasil e no exterior. Exímio intérprete, logo se mostra também um compositor de qualidade, parceiro de letristas do calibre de Paulo César Pinheiro e Aldir Blanc.
Recebeu inúmeros prêmios em sua carreira e em sua estadia nos EUA, para onde mudou-se em 1994, atuou como professor convidado em uma universidade de música na Califórnia. Esta experiência estimulou seu desejo de criar no Brasil uma escola de música de nível superior – a Universidade de Música do Brasil. O projeto, que chega a ser iniciado modestamente em Brasília, em parceria com o Reco do Bandolim, acaba se transformando, após a sua morte, na Escola de Choro Raphael Rabello, primeira no gênero no país.
Seu nome, no entanto, já estava gravado na galeria dos maiores artistas do país. Continuador da tradição moderna do violão brasileiro, derivada dos clássicos e do choro, Raphael Rabello desenvolveu uma habilidade técnica sem precedentes, levando um sopro de energia e juventude ao choro, gênero até então associado a músicos mais velhos. Explorou todas as possibilidades técnicas do violão e, em particular, do sete cordas. Além de solista, tornou-se um acompanhador de extrema qualidade, cúmplice dos cantores e dos músicos com os quais tocava. Sua carreira, tão curta quanto brilhante, foi suficiente para gerar reconhecimento e admiração entre os maiores nomes da música dentro e fora do país.
Uma análise segundo a Enciclopédia Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras:
“Diversos críticos, especialistas e músicos – como Tom Jobim, Radamés Gnattali, Paco de Lucia, Guinga, Joel Nascimento, Turíbio Santos – classificam Raphael Rabello como um dos maiores violonistas brasileiros de todos os tempos. Mesmo com uma breve carreira, ele atua em mais de 600 gravações com importantes nomes da música nacional e internacional. Faz apresentações no Brasil e no exterior. Revoluciona a história de seu instrumento.
O berço familiar, recheado de músicos, exerce influências em Raphael desde cedo. Aos 10 anos, surpreende amigos e familiares após escutar por diversas vezes o disco Vibrações (1967), de Jacob do Bandolim e Época de Ouro. Em pouco tempo, de maneira autodidata, toca todas as “baixarias” iguais às feitas por Dino Sete Cordas no álbum. Ainda acrescenta variações criadas por ele mesmo.
De todos os professores, o mais importante é o violonista Meira (Jayme Florence). Mesmo sendo um especialista em choro e no violão tradicional (de seis cordas), Meira apresenta a Raphael outros gêneros populares e eruditos. Igualmente relevantes são os ensinamentos das sequências harmônicas em diversas tonalidades, preparando Raphael para improvisos e acompanhamentos nas rodas de choro ou em outros estilos.
Por conta própria, estuda as várias escolas de violão e condensa décadas de tradição do instrumento em seu estilo. Raphael reúne as linguagens brasileiras de Villa-Lobos, Dilermando Reis, João Pernambuco, Garoto, Meira, Dino Sete Cordas e Baden Powell. Incorpora também linguagens estrangeiras, como a espanhola – de Francisco Tárrega, Josefina Robledo e do expoente da escola flamenco, Paco de Lucia – e a latina, com o paraguaio Augustín Barrios.
Embora ligado ao cancioneiro popular, Raphael escreve partituras com competência, além de demonstrar conhecimento de autores eruditos e afeição por eles. Prova disso é o disco Delicatesse, com Déo Rian, em que registra peças de polonês Frédéric Chopin, do russo Pyotr Tchaikovsky, do austríaco Franz Schubert, do boêmio Antonín Dvorák e dos alemães Robert Schumann e Johannes Brahms.
Ao longo de sua carreira, a exímia técnica permite-lhe interpretar partituras complexas. O músico domina o violão tradicional de seis cordas, mas dedica-se ao instrumento de sete cordas. Não à toa, assina o primeiro disco solo como Raphael Sete Cordas.
Destaca-se como solista, sendo classificado como um virtuose, e no acompanhamento. Mesmo no papel de produzir uma base harmônica para outros instrumentistas – como nos discos com Déo Rian, Paulo Moura, Armandinho e Radamés Gnattali – e para cantores – como Ney Matogrosso, Nelson Gonçalves, Gal Costa e Elizeth Cardoso –, Raphael vai além do acompanhamento. Evidências disso são a afinação de seu violão (muitas vezes com a sexta corda afinada em Ré, no lugar da tradicional Mi), as inversões de acordes criadas por ele, as introduções, pontes, mudanças de dinâmica, os interlúdios ou as dobras de notas e os fraseados.
Além disso, a ousadia de não tocar o violão de maneira tradicional, inserindo características de outros estilos em um determinado gênero, transforma Raphael em um músico híbrido. Essa característica faz com que seja um dos músicos mais requisitados do país para gravar e acompanhar artistas em shows. Exemplos da fusão de estilos dentro de uma só composição aparecem em suas interpretações de “Retrato em Branco e Preto” (Tom Jobim e Chico Buarque) e “Prelúdio n. 5” (Villa-Lobos).
O violonista cria uma harmonia moderna para choros antigos, como nas músicas “Sons de Carrilhões” e “Odeon”, do disco de Dino Sete Cordas. Ao dominar a técnica de usar o polegar da mão direita como apoio, Raphael recria arpejos, transformando a estética do violão brasileiro.
Nos arranjos, mostra-se inventivo e intuitivo na releitura de temas antológicos. Suas criações e ornamentações são tantas que ele é considerado por críticos e especialistas uma espécie de “coautor” das composições originais. As recriações mais conhecidas estão registradas em “Lamentos do Morro” (Garoto), “Samba do Avião” (Tom Jobim), e “Abismo de Rosas” (Américo Jacomino “Canhoto”). Sem contar diversas músicas do disco Mestre Capiba por Raphael Rabello e Convidados, gravadas ao lado de Chico Buarque, Paulinho da Viola, Francis Hime, Gal Costa, Caetano Veloso, Alceu Valença e Milton Nascimento.
Em menos de 20 anos de carreira, Raphael deixa 29 composições de sua autoria. São temas de diferentes linguagens, como valsas e sambas, mas a predominância é do choro. No campo instrumental, escreve composições sozinho, como “Choro em Lá Menor”, “Choro em Si Maior”, “Olho D’Água”, “O Sorriso da Luciana” (inédita) e “Meu Avô”, em homenagem a seu avô materno. Além disso, assina parcerias com sua irmã, Luciana Rabello em“Cá Entre Nós”, Dininho e Cristóvão Bastos em “Choro em Lá Bemol Menor” e Toquinho em “Pedra do Leme”.
Seus maiores parceiros são os poetas Paulo César Pinheiro com “Camará”, “Martírio”, “Retrato de Saudade” e “Sete Cordas”, entre outras, e Aldir Blanc, com “Anel de Ouro”, “Galho de Goiabeira” e “Ouro e Fogo”. Ministra aulas em Los Angeles, Estados Unidos, onde mora durante a década de 1990. Como um dos inventores do violão moderno brasileiro, Raphael influencia uma série de instrumentistas, como Yamandú Costa, Marcus Tardelli, Rogério Caetano, Marcello Gonçalves e Alessandro Penezzi”.
FONTES
ENCICLOPÉDIA ITAÚ CULTURAL DE ARTE E CULTURA BRASILEIRAS: http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa638057/raphael-rabello
ACERVO CASA DO CHORO: